Vivia no meio da rua,
sem endereço e sem pouso certo, um cão que de tão magro e franzino era
conhecido entre a cachorrada como Sibite.
Sibite podia se
definir como a própria liberdade encarnada em um cão. Não tinha casa, não tinha
laços com ninguém, era dono de si, sua vontade dirigia seus atos. Era assim um
cosmopolita.
Certa feita, Sibite
dormia tranquilo embaixo do banco de uma praça, uma praça qualquer, dessas que
ele elegia como seu lar provisório, quando se deixou prender a atenção para um
homem que sentado no banco da praça chorava como criança.
Sibite se comoveu com
a dor daquele homem. Não sabia do que se tratava, aliás, nem tinha a pretensão
para tanto, mas, por um instante, pode sentir a dor dele que de tão grande fez
Sibite querer dividi-la, na esperança de que compartilhada fosse aliviada como
um sopro gélido em feridas escaldantes.
E nesse transe de
compartilhamento de sentimentos, Sibite conheceu a dor do homem e ela tinha
nome: Chamava-se decepção.
Quis conhece-la
melhor, sua face era desfigurada, teve medo. Sibite fez da fraqueza força e a
enfrentou. Percebeu que se mostrava de diferentes maneiras, a daquele homem era
imensa, com raízes na honra e galhos no ego.
Estando frente a frente quis saber dela mesma
a sua razão e ela logo respondeu: Foram promessas quebradas. Pode sentir que a decepção, embora sentimento
único, se apresenta com duas faces que oscilam entre o ingênuo inacreditável do
“antes” e a cruel constatação da realidade dos fatos do “depois”.
Desnorteando a razão, revela-se um fardo
pesado, difícil de carregar já que seu caminhar é sem chão, sem rumo, apresentando
muitas estradas, mas nenhuma direção. E porque sem chão, para continuar, ao ser
decepcionado não resta outra alternativa a não ser do peito dilacerado criar
asas e aprender a voar.
Sibite silenciou porque compreendeu que por
mais que se compadecesse daquele homem, somente a ele cabia se reinventar e,
nesse novo ser, encontrar novas razões para viver. Quem sabe o choro do homem -
criança não fosse o início do aprendizado de que somente se despojando de si,
se poderá encontrar o verdadeiro “eu”.
Cristiane Caracas
19/10/2014
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