A existência de Deus
é um sentimento inato ao ser humano. A adoração, como a elevação do pensamento
a Deus, existe entre todos os povos em diferentes formas. Essa espiritualidade
vem sendo manifestada desde os primórdios da humanidade, quando ainda os nossos
ancestrais já acreditavam no poder mágico da natureza, estendendo-se pelas
primeiras civilizações, chegando aos textos sagrados, aos ensinamentos dos
grandes profetas, até que a experiência humana dessa espiritualidade se
convertesse em religião institucionalizada. A vivência do sagrado como experiência
interior foi se diluindo ao longo do tempo, sobretudo nas culturas ocidentais.
Os ritos foram sendo incorporados e automatizados e o significado espiritual
transcendente foi sendo alienado da vida das pessoas. Com o tempo, o homem
passou a confiar somente naquilo que os seus próprios olhos viam, pois
precisava acreditar que as coisas estavam sob seu controle, já que isso lhe
trazia mais segurança. Pensar dessa forma, no entanto, comprometia a natureza e
a intensidade de sua fé e, por conseguinte, sua relação com Deus.
Nas últimas décadas,
contudo, começa a emergir nos povos do mundo inteiro um movimento no sentido de
resgatar a espiritualidade humana, assim como já é possível perceber uma tímida
aproximação entre a ciência e a espiritualidade. Entretanto, entender a dimensão espiritual da realidade não é tarefa fácil, tendo
em vista certa sobreposição de conceitos, no que diz respeito à
espiritualidade, religião e religiosidade. Além do mais, discutir quaisquer desses
aspectos implica, necessariamente, uma discussão preliminar sobre fé, tendo em
vista que esta permeia todas essas instâncias da subjetividade humana.
CONSIDERAÇÕES SOBRE FÉ
Segundo Breitbart (2005), a espiritualidade é uma
construção formada por fé e sentido. Já o dicionário Vine (Urger; White; Vine, 2002)
define o termo “fé”, do grego “pistis”, como “persuasão firme”, convicção
fundamentada no ouvir (cognato de peithõ, “persuadir”). Assim, pode-se dizer que fé é uma determinada
estrutura de sentido e de valores que cada um constrói para dar significação à
sua existência dentro do real. Todos nós temos uma fé, que é aquilo que dá
sabor à nossa existência. No sentido antropológico do termo, “fé é uma relação
com o fim visado e que dinamiza todo o processo de ir em direção a ele. Seria a
determinação que dá toda energia ao agir” (SEGUNDO, 1983, 1997).
Segundo os
estudiosos, todo o ser humano tem imanente dentro de si um poder capaz de criar
tudo aquilo que deseja com uma vontade firme e persistente. De acordo com essa
premissa, referem às Escrituras Sagradas que somos feitos à imagem e semelhança
de Deus e, consequentemente, em seu espírito – que é a parte do Espírito
infinito, do qual procede – residem o poder infinito e a sabedoria infinita. (GÊNESIS
1,26).
Essa capacidade nos é inerente e responde de
maneira diretamente proporcional às nossas crenças e convicções. Ter fé é
acreditar na realização do seu propósito. É trazer ao mundo, através da vontade
firme, as coisas que esperamos.
Nessa linha de pensamento, define o apóstolo Paulo:
“Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, a convicção de fatos
que não se vêem. Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de
Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem”
(HEBREUS, 11,1,3).
Para Chardin (1980), “fé
é a certeza inabalável de que o Universo, considerado em seu conjunto, tem uma
finalidade e não pode nem se enganar de itinerário, nem se deter no caminho”.
Frankl (2003) discute
a fé como uma ligação com o esperado, a determinação da ação, o vivido de uma
opção que mobiliza todo o ser.
O autor enfatiza,
ainda, que o homem sempre apresentou, mesmo inconscientemente, um vínculo
intencional com Deus, a quem ele denomina de “Deus inconsciente”. Complementa
dizendo que o ser humano tem uma religiosidade inconsciente, pois
nos campos de concentração, em meio à angústia, ele percebeu que uma fé surgia,
uma esperança no futuro fazia brotar o sentido da vida, a crença em Deus, que
parecia estar oculta. A isso ele chamou de dimensão noética ou espiritual
humana (FRANKL, 2006).
Não falamos aqui de
fé em crenças dogmáticas de religião convencional – ritual, cerimônia, forma ou
instituição. A ideia de que a fé só tem a ver com a nossa experiência religiosa
é um engano. Ela é, portanto, uma faculdade da mente que tem a sua máxima
expressão na atitude religiosa.
Segundo Trevisan
(1980), “a mente também tem as suas leis e seus princípios que nunca falham,
quando usados corretamente; por exemplo: o pensamento cria, o desejo atrai e a
fé realiza. Isto quer dizer que tudo o que você pensa, deseja e acredita que
vai acontecer, acontece obrigatoriamente”.
O Mestre Jesus, que
conhecia todas as leis universais, ensinava este princípio, quando dizia: “Pedi e recebereis”. (MATEUS 7,7). Nesse mesmo sentido, ainda
declara : “Seja-vos feito
segundo a vossa fé” (MATEUS 9,29).
Definiu claramente
que a sua metodologia de ação estava inteiramente ancorada no poder da fé. E
ainda ressalta: “Se tiverdes fé como um grão de mostarda direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele passará. Nada vos será impossível” (MATEUS 17,20).
Fé é aceitar
definitivamente uma coisa como verdadeira. Em outras palavras, é trazer o
invisível para o mundo de manifestação. É materializar as formas originais oriundas
do mundo das ideias.
Podemos deduzir daí que a fé é o instrumento que
move e sustenta o reino invisível, contribuindo para o desenvolvimento de uma
espiritualidade amadurecida e, consequentemente, para um relacionamento mais
verdadeiro com Deus.
Jeruzia
Costa de Medeiros
* Artigo científico apresentado ao Curso de Pós-graduação (Lato
Senso) em Psicologia Transpessoal da Faculdade de Tecnologia Darcy Ribeiro em
parceria com o Instituto Celta, como requisito parcial para obtenção do Título
de Especialista em Psicologia Transpessoal.
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