Atendi em terapia uma
jovem a quem, inicialmente, perguntei: Em que posso lhe ajudar? Respondeu: “A conhecer-me
melhor e a me libertar. Pois não me entendo, nem sei por que sinto tristeza,
angústia e um vazio dentro de mim. A vida sem sentido. Sem gosto de viver. Sou depressiva.”
Com ela vieram seus pais.
E, como de costume, conversei antes com eles. Perguntei à mãe três coisas
básicas. Primeira: Quando você ficou grávida desta filha, como se sentiu? Disse:
“Foi horrível. Rejeitei-a. Ainda namorava, e aconteceu. Não foi esperada. Tive
medo dos meus pais e vergonha das pessoas.” Segunda: Como foi o parto?
Respondeu: “Chegou o dia, ela não nascia, o médico fez parto cesariano.”
Terceira: Deu de mamar? Resposta: “Não! Incrível, ela não quis mamar. Rejeitava
meus peitos.” A mãe completou: “Eu sinto que ela não gosta de mim. Tem uma
revolta e é grosseira comigo. Sei, hoje, que sou culpada pelo sofrimento dela.”
Ao pai perguntei: Quando criança, você brincava com ela, era carinhoso? “Pouco”,
disse ele. “Na verdade, eu e minha esposa trabalhávamos muito e quem cuidava
dela era a babá. Mas percebo que ela gosta mais de mim do que da mãe.” E a mãe
concluiu a conversa: “Minha ausência foi tanta, que ela chamava a babá de mãe.
Era triste.”
A partir desses
relatos dos pais, entendi o sofrimento da filha. Era uma vítima das rejeições vividas.
O inconsciente registrou tudo desde os primeiros instantes de vida no útero
materno. E estava repercutindo em sua vida atual.
O ser humano, para
viver um futuro saudável, com saúde física, psíquica e emocional, precisa ser acolhido
e amado desde o ventre materno. Ele necessita ser cuidado e acompanhado com
amor em cada fase do seu desenvolvimento. Fases: oral, anal, fálica e da
latência. As falhas ou omissões nestas fases geram neuroses profundas, como as dessa
filha.
O inconsciente é literal,
não analisa nem julga o que recebe, ao contrário, registra e executa o que é introjetado,
sem que a pessoa tenha consciência das causas dos sintomas que vivencia. Ele registra
os fatos com os sentimentos do momento e revive-os depois.
Traumas profundos como
o relatado podem ser ressignificados por atitudes e terapias que atinjam, amorosamente,
suas causas, trabalhem o perdão e restaurem o gosto de viver no mais profundo
do ser humano.
Luciano
Sampaio
Psicanalista
e hipnólogo
lucianosampaio53@gmail.com
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