Rui
era uma graúna que vivia entre os coqueiros de uma pequena serra lá no interior
do Nordeste.
Certo
dia, Rui viu uma ave diferente, tinha certeza de que nunca tinha visto antes
nada parecido. Uma ave linda, branca, bico rosado e que
trazia no bico um papel colorido. Rui, meio tímido e ao mesmo tempo curioso,
aproximou-se e perguntou:
- Que ave é você?
- Sou uma pomba, respondeu a
ave, estufando o peito de orgulho.
- Uma pomba!? exclamou Rui.
-E o que fazem as pombas?
- Sou muito importante, não
sou uma pomba qualquer. Sou uma pomba correio e minhas penas são do mais puro
branco, não vês?
- E daí, disse Rui. As
minhas são do mais puro preto e voam iguais às suas.
- Mas você não serve ao
homem, eu sim, tenho serventia, levo e trago mensagens importantes.
Rui
pensou: de fato não sirvo ao homem. Saiu cabisbaixo e convicto de sua condição
de inutilidade.
Pouco
tempo depois, Rui, por uma distração, deixou-se capturar por uma arapuca
montada por um caçador de pássaros.
E
deu-se o triste destino de Rui: ficar em uma gaiola tendo que cantar todos os
dias para o homem que o aprisionou.
Foi
aí que ele lembrou da pomba e pensou: agora sirvo ao homem, assim como a pomba,
e nem por isso me sinto melhor que as outras aves. Gostava mesmo era de cantar
e voar livremente sem me preocupar em ser útil ou não a ninguém, sendo somente
o que era: uma graúna.
De
novo pensou na pomba e compreendeu que ela devia ser infeliz, porque embora sem
gaiola era também prisioneira da vontade do homem. Ora, que diferença agora
fazia ser do mais puro branco ou do mais puro preto? Ele e a pomba eram
escravos de suas utilidades.
Foi
então que avistou sua amiga pomba, com mais uma mensagem no bico, pronta para
servir ao homem que a aprisionava, embora ela não percebesse e ainda se
orgulhasse de sua vã utilidade.
Rui,
mais que depressa, perguntou:
- Por que não me libertas?
Não vês que estou preso?
A
pomba retrucou:
- Não te liberto porque tu
só és útil preso em uma gaiola. De que servirás cantando para ninguém ouvir?
Não vês que te mantendo preso presto-te um grande favor, livre tu és inútil e
não passas de uma graúna qualquer, preso tu és a graúna do homem e terás o
privilégio de cantar para ele.
Rui respondeu:
- Ao contrário, de que me
serve um canto lindo que não pode ser ouvido por todos que passem em minha vida
e que seja a expressão da minha felicidade e não o canto oprimido pelo desejo
daquele que me aprisiona porque não sabe cantar assim como eu.
A
pomba, ainda relutante, abriu a gaiola do amigo com seu bico e soltou Rui que
pode sentir novamente a sensação de liberdade.
- Não se deixe aprisionar
por gaiolas invisíveis, disse Rui, liberte o seu pensamento e seja útil
primeiro a si mesma. Somos aves e temos que viver de acordo com a nossa
natureza, temos asas e se as temos é porque é da nossa natureza ser livres e
voar.
Naquela
hora a pomba deixou cair no chão a mensagem que trazia no bico que dizia assim:
somos aquilo que pensamos ser, sonhamos ser e desejamos ser, desde que nos
permitamos pensar, sonhar e desejar.
Fortaleza/CE, 13 de dezembro de 2013.
Cristiane Caracas
Cristiane Caracas
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