sábado, 8 de novembro de 2014

Da Religiosidade à Espiritualidade: um caminho percorrido - Parte VI - Espiritualidade


As reflexões sobre religião, religiosidade e espiritualidade vêm ganhando cada vez mais espaço no mundo contemporâneo não apenas no seio da população laica, mas, sobretudo, nos meios científicos onde as pesquisas apontam para uma possível relação entre espiritualidade, saúde, qualidade de vida e longevidade.
O termo “espírito” tem a origem latina spiritus e quer dizer “sopro” ou “respiro”, em referência ao “sopro da vida”. Envolve, também, o sentimento de gratidão pela vida, o desenvolvimento de ver o sagrado nos fatos comuns, de remeter a uma questão referente ao significado e ao propósito da vida, de ter fé, de amar, de perdoar, de adorar, de transcender o sofrimento e de refletir sobre o significado da vida (SOMMERHALDER e GOLDSTEIN, apud FREITAS, 2006, p.1307).   
Hufford (s.d), citado por Stroppa e Moreira (2008), busca uma definição mais objetiva e ligada à origem etimológica da palavra espiritualidade, a noção de espírito. Para ele, “espiritualidade se refere ao domínio do espírito”, ou seja, à dimensão não material, extrafísica da existência, que pode ser expressa por termos como: “Deus ou deuses, almas, anjos e demônios”.  Habitualmente, refere-se a “algo invisível e intangível, que é a essência da pessoa”.
SOMMERHALDER e GOLDSTEIN (2006) discutem a compreensão atual de espiritualidade enquanto atitude de atenção e cuidado para consigo mesmo e com outras pessoas, podendo ser capaz de transcender e de se perceber espiritualizada, sem pertencer a qualquer religião específica ou cultuar qualquer natureza de divindade. Enfim, compreendem espiritualidade como algo que vai além de ideologias, dogmas ou instituições religiosas, funcionando como “um recurso interno do indivíduo, que pode ser acionado pelo contato com a natureza, com as artes, com a experiência de doação de si ou com o engajamento em causas que visam o bem coletivo.
Na mesma linha de pensamento, Angeramim (2008) descreve espiritualidade como a busca de elevação da condição humana que não depende necessariamente da busca de Deus ou de alguma instância de elevação e deificação. Assim, tudo o que for buscado na tentativa de elevação humana pode ser considerado um ato de espiritualidade ou, se preferirmos, de elevação espiritual. “Não é a busca de Deus ou da verdade que anima essas experiências religiosas. É a satisfação de necessidades pessoais” (ANTONIAZZI, 1998, p.17).
“Espiritualidade é uma busca pessoal pela compreensão das questões últimas acerca da vida, do seu significado e da relação com o sagrado e o transcendente, podendo ou não conduzir ou originar rituais religiosos e a formação de comunidades” (HUFFORD, (s.d), apud STROPPA E MOREIRA, 2008).
Leonardo Boff (2001), teólogo e escritor brasileiro, afirma que nos tempos atuais a espiritualidade vem sendo descoberta como dimensão profunda do humano; como um espaço de paz no meio de conflitos e desolações sociais existenciais. Ainda nessa perspectiva, Boff (2006) reconhece a espiritualidade como uma das fontes primordiais, embora não seja a única, de inspiração do novo, de esperança, de geração de um sentido pleno e capacidade de autotranscendência do ser humano, pois, segundo ele, o ser humano que a desenvolve e a vive realmente celebra a alegria nesse encontro com Deus ao festejar Sua presença como sentido de tudo.
Segundo Frankl (2003), a essência da espiritualidade é o impulso de buscar significado e propósito para a existência. Além disso, a espiritualidade tem sido vista como a base emocional e motivacional para a busca por significado.
No contexto geral, observa-se que a maioria dos autores comunga com a ideia de que a razão maior da espiritualidade é encontrar o propósito e significado da vida – uma necessidade intrínseca de todo ser humano – e, no que fica claro, o atendimento dessa necessidade não passa, necessariamente, pela religião. É o que Deus revela através do profeta Isaías, dizendo:   
“Este povo vem a mim, e com a sua boca e com os seus lábios me honra, enquanto seu coração está longe de mim, e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, que maquinalmente aprendeu, portanto, continuarei a tratar este povo de modo tão estranho que a sabedoria dos espertalhões se perderá e a inteligência dos malignos desaparecerá” (ISAÍAS 29,13-14).
Nos estudos revisados, observa-se que muitos autores sobrepõem os conceitos de religiosidade e espiritualidade como se ambos os termos significassem a mesma coisa, enquanto outros conseguem estabelecer alguma diferença.
Para Elkins (1998), a participação em cultos, a repetição de rituais e a crença em ritos são, geralmente, associadas à religiosidade. Já o cultivo do espiritual, valores, transcendência e fé são considerados parte do fenômeno da espiritualidade, que é encontrado em todas as culturas e em todas as idades. Sommerhalder e Goldstein (2006) vêm fazer coro a esse pensamento quando dizem que religiosidade e espiritualidade são compreensões diferentes: “enquanto espiritualidade remete a uma reflexão “sobre”, a religiosidade remete a uma reflexão “com”.
Jeruzia Costa de Medeiros
*Artigo científico apresentado ao Curso de Pós-graduação (Lato Senso) em Psicologia Transpessoal da Faculdade de Tecnologia Darcy Ribeiro em parceria com o Instituto Celta, como requisito parcial para obtenção do Título de Especialista em Psicologia Transpessoal.

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