quinta-feira, 27 de julho de 2017

Caso Clínico em Psicanálise XV – Uma regressão a vidas passadas; ou Conhecendo a dor para curar-se



A regressão a vidas passadas, ou como alguns preferem Terapia de Vidas Passadas, é uma técnica que tenho utilizado no meu trabalho psicanalítico quando outras ferramentas mostram-se ineficazes. No meio psicanalítico, a referida abordagem tem vários defensores, entretanto, tem também profissionais que a evitam ou até mesmo entendem que é apenas ilusão do paciente.
Pois bem, tenho me posicionado no sentido de que os sucessos obtidos pela TVP são as melhores credenciais em defesa dela, tudo o mais são discussões teóricas que no geral esbarram nos limites das crenças de cada um.
Passo a narrar um dos casos que utilizei a abordagem da TVP.
Nice era uma jovem senhora solteira com bastante sucesso na vida profissional, entretanto sua vida afetiva estava em desequilíbrio. Sua queixa principal referia-se a uma obsessão que ela tinha com um antigo namorado, Pedro, que atrapalhava sobremaneira os seus relacionamentos. A fixação de Nice no ex-namorado era o principal fator que impedia novos relacionamentos e tirava a sua paz. O relacionamento com o ex-parceiro não tinha sido nada fácil, Pedro tinha índole violenta e as brigas e discussões eram recorrentes, chegando ao ponto da agressão física.
Após ter tentado sem sucesso outras abordagens com Nice, perguntei a ela se poderíamos tentar a TVP, e ela prontamente concordou. 
Depois de uma rápida indução, Nice se via no corpo de uma outra mulher, que ela identificou como Rana, uma bela e pobre jovem em algum lugar da França no século XIII. Via-se como uma camponesa cheia de sonhos e planos que havia iniciado um relacionamento com um homem mais velho que ela, de nome Thomas.
Adiantei-a no tempo para um evento relevante que justificasse a sua relação atual. Rana agora estava morando em uma pequena casa que Thomas havia comprado para ela em uma região distante da cidade. Thomas agora era monge, um cavalheiro templário, que almejava alcançar o título de Grão-mestre da Ordem Templária. Aquele objetivo de Thomas e pelo fato de ser proibido casar pelo voto da castidade, o levara a esconder o relacionamento com Rana da sociedade local, fato que muito a incomodava e que era motivo constante de desentendimento do casal.
Certa feita, Thomas a visitara e disse que iria se ausentar por longa data e que achava melhor que ela permanecesse longe da sociedade para não levantar suspeitas. Aquela atitude foi a gota d’água para Rana, que tinha sonhos de casar e ter uma vida normal. Uma violenta discussão iniciou-se e Thomas empunhou sua espada e atingiu o flanco esquerdo de Rana.
Nice passou a sentir a dor da morte de Rana. Adiantei-a um pouco no tempo e ela se viu como espírito flutuando sobre o corpo sem vida de Rana, enquanto Thomas fugia confuso em seu cavalo.
De posse das técnicas adequadas, solicitei ao espírito de Rana que perdoasse Thomas daquele ato e também vislumbrasse Thomas pedindo perdão a ela. Após algumas outras instruções com o foco no Amor, Perdão, Compaixão, Aceitação, Não-resistência e Gratidão, trouxe Nice de volta ao tempo presente.
Nice ficou maravilhada com a experiência e no mesmo dia me enviou uma empolgada mensagem dizendo que havia encontrado na internet todas as informações que havia vivenciado na regressão: o nome de Thomas era Thomas Berard (ou Bernard) e o objetivo de Tomas fora alcançado, ele havia se tornado grão-mestre dos Cavalheiros Templários de 1256 a 1273.
Agradeci a Nice sua pesquisa, mas destaquei que o mais importante não era o fato em si, mas a ressignificação das emoções a partir do conhecimento do fato.  
Após aquela sessão Nice demonstrara uma melhora acentuada de seu quadro neurótico, mas ainda houve necessidade de continuar com mais algumas sessões da TVP. Entretanto, isso é outra história...
José Anastácio de Sousa Aguiar
*nomes, sexos e alguns detalhes foram alterados para proteger a identidade dos pacientes.

Procures me amar quando menos mereço... - Mário Quintana


domingo, 2 de julho de 2017

Caso Clínico em Psicanálise XIV – A formação de um Complexo; ou O Amor e Perdão como ressignificantes universais




Era a primeira vez que atendia Katia, uma jovem de cerca de 30 anos que adentrou à sala com os ombros arqueados e sem brilho nos olhos. Ela me procurara com uma demanda de severa ansiedade. Contou-me que seu estado de agitação constante a vinha incomodando desde quando era criança, entretanto nos últimos anos, em especial, no período da faculdade, estava se tornando insuportável, a ponto de influenciar negativamente na tomada de decisões simples, como escolher uma roupa.
Realizando a anamnese, foi possível identificar que na verdade, a ansiedade era apenas uma das questões que a afligiam, ela também tinha um elevado grau de insegurança, bem como uma baixa autoestima. Contou-me que sua mãe sempre foi muito exigente com ela e sempre comparava de forma pejorativa a sua personalidade introvertida com a personalidade extrovertida da sua irmã mais velha.
Pois bem, durante a análise, por meio do método freudiano da Associação Livre, Kátia não conseguiu lembrar-se de nenhum evento que pudesse ser o catalisador das questões que hoje a incomodavam. Todas as vezes que lembrava algo de um passado remoto, suas palavras eram interrompidas por abundantes lágrimas.
A retomada do equilíbrio emocional era a pedra angular daquele caso. Utilizando de algumas técnicas de relaxamento, Katia retomou o controle de suas emoções e pedi para ela que olhasse fixamente para a porta que estava a sua frente e deixasse a sua mente livre para fluir seus pensamentos. Perguntei o que ela gostaria de fazer e ela me respondeu que gostaria de abrir a porta. Pedi que desse seguimento a seu desejo, só que desta vez de olhos fechados. Ela me contou que ao abrir a porta, viu um quarto escuro com a sensação de que as pessoas estavam olhando para ela. Sentia-se acuada, insegura e com medo.
Utilizando as técnicas de hipnose, facilitei a regressão de Katia ao momento da gênese do seu trauma. Ela visualizou uma cena que já havia se apagado do seu consciente há muito tempo: ela tinha cerca de 5 anos quando a sua mãe se irritou quando ela derrubou um copo de leite sobre o tapete e comparou-a de forma ríspida e humilhante com a irmã. Aquele evento ficou congelado em sua memória, gerando um Complexo, que constantemente era constelado com os eventos da vida diária que se referissem ao tema.
Após a utilização das técnicas terapêuticas apropriadas para o caso dela, pedi, para finalizar, que ela visualizasse a mãe dela aproximando-se e pedindo que a abraçasse, ao mesmo tempo que ambas pediam perdão uma para outra. Por longos minutos, Katia permaneceu abraçada a sua mãe, enquanto as lágrimas escorriam, mas já não mais de insegurança e medo, e sim fruto da convicção daqueles que sabem que são amados.
Tivemos uma longa conversa sobre os mecanismos inconscientes que influenciam a mente consciente e a tornam, quando não verdadeiramente compreendidos, vulneráveis aos Complexos que povoam o Inconsciente. Expliquei, em especial, que os Complexos, conteúdos autônomos do Inconsciente Pessoal formado por lesões ou traumas psíquicos, tem em seu núcleo a imagem do evento traumático e orbitando a imagem encontram-se as emoções negativas geradas pelas lesões. A função da terapia é descongelar a imagem nuclear por meio da ressignificação das emoções e o meio mais eficaz da técnica terapêutica é a verdadeira realização do Amor e Perdão.
Renovada, Katia, agora, tinha uma melhor compreensão de suas pulsões instintuais e podia dar novo começo a sua vida emocional e aos seus relacionamentos. Despediu-se com um ar de esperança e um renovado brilho no olhar.  

José Anastácio de Sousa Aguiar
Psicanalista, hipnoterapeuta e terapeuta de vidas passadas
*nomes, sexos e alguns detalhes foram alterados para proteger a identidade dos pacientes.